Vi uma vez Chico Anysio explicar o motivo de o humor de bordão fazer tanto sucesso. Segundo o mestre, é porque o brasileiro gosta de ver o que já sabe, mas disfarçando que não sabe. Isso traz uma sensação de sabedoria e superioridade que faz bem, em meio a tanto massacre que ele passa no seu dia-a-dia. E não por coincidência, esse recurso tem muito mais força no Brasil.
Na verdade, nem precisava de mais nada para confirmar, mas após ter lido um texto de Martha Medeiros, pude comprovar isso de maneira bem clara. Hoje, ao meu lado na barca, duas quarentonas conversavam sobre a vida amorosa. Dá-lhe frases e conclusões de textos de Martha Medeiros. No almoço, duas garotas de vinte e alguma coisa falavam, num tom não muito baixo, sobre suas desilusões e redescobertas. E dá-lhe Martha Medeiros de novo. Não tem jeito. Vai ser assim sempre, a menos que eu fique surdo.
Essa - eu acho - é a esperteza da Martha Medeiros: entender e praticar o que Chico Anysio falou. Ela repete o que as mulheres já sentem e dizem o tempo todo, mas de forma muito encaixadinha, fluente, sem maiores surpresas. Ou, para muitos, sem complicações. Tudo como num bordão de humor, inevitável de aparecer no quadro.
Com Woody Allen, falar das emoções cotidianas dá um filme surpreendente. Com Clarice Lispector, dava um texto que vem de dentro da mente. Com Sienfeld, deu uma série de seis anos que falava de nada como se fosse tudo, e ficou bom pra cacete. Enfim, neles e em outros, isso aparece de forma diferente, não usual.
Da minha parte, eu prefiro assim, porque ver tudo repetido, muito próximo do que acontece normalmente, não me traz graça. Talvez por pretensão ou por eu ser uma exacerbação com nome abreviado do cara crítico: o cri-cri. Mas Martha Medeiros não está nem aí. Ela escreve. E quem não quer descobrir o que mais a cena pode significar, sempre termina de ler feliz da vida.